Entrada Domiciliar Sem Mandado Sempre Exige Prova Documental Da Autorização ?

🏛️ 1. O Dilema Constitucional: entre o asilo inviolável e a repressão ao crime
A inviolabilidade do domicílio — consagrada no art. 5º, XI, da Constituição da República — não é um direito absoluto. Ao lado da cláusula de proteção ao lar privado, convivem exceções expressamente previstas, como o flagrante delito, o desastre, o socorro e o cumprimento de mandado judicial durante o dia.
O problema prático, no entanto, emerge quando a autoridade policial, sem mandado, adentra o domicílio com base em suposta autorização verbal de um morador. Nesses casos, é imprescindível delimitar quando essa permissão deve ser formalmente comprovada e quando a ausência dessa formalização não compromete a licitude da diligência.
🧩 2. O ponto central: quando se exige a prova documental do consentimento?
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem oscilado entre duas posições interpretativas:
✅ POSIÇÃO FLEXÍVEL: desnecessidade de registro formal
Em situações nas quais haja um robusto contexto de flagrância, amparado por elementos objetivos, contemporâneos e juridicamente relevantes, o consentimento verbal do morador, mesmo não documentado, pode ser considerado suficiente — desde que:
📌 Os relatos dos agentes públicos sejam coerentes entre si,
📌 Estejam em harmonia com os demais elementos dos autos, e
📌 Não haja indícios de coação, intimidação ou desvio de finalidade.
Exemplo paradigmático:
No julgamento do AgRg no RHC 200.123-MG (Info 847/STJ), a Quinta Turma considerou legítima a entrada na residência do investigado sem mandado e sem gravação da autorização, pois:
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Havia diversas denúncias anônimas convergentes;
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Foi encontrado com o suspeito arma de fogo municiada em via pública;
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O próprio indivíduo confessou guardar drogas em casa, indicando o local;
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A companheira do investigado autorizou verbalmente a entrada, segundo os depoimentos dos policiais, sem qualquer sinal de coação.
📌 Nessa hipótese, o STJ entendeu que o contexto probatório supria a ausência de formalização do consentimento.
🚨 POSIÇÃO RESTRITIVA: necessidade de prova expressa da autorização
Por outro lado, quando o contexto do flagrante é frágil ou inexistente, e o único elemento legitimador da entrada é a suposta autorização do morador, o ônus recai sobre o Estado para comprovar, de forma inequívoca, a voluntariedade do consentimento.
📽️ Nesses casos, exige-se que a permissão esteja registrada por escrito, ou preferencialmente, em áudio e vídeo.
Exemplo ilustrativo:
No AgRg no HC 766.654-SP (Info 759/STJ), a Corte reconheceu a ilicitude da entrada domiciliar, pois:
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A abordagem se deu com base exclusiva em denúncia anônima;
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Nada de ilícito foi encontrado na posse do suspeito na via pública;
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A companheira alegou ter sido coagida a autorizar a entrada, sob ameaça de "perder a guarda do filho".
🛑 Sem qualquer outro indicativo de flagrante, a autorização verbal não documentada foi considerada inválida, e a diligência, abusiva.
📚 3. Regras extraídas da jurisprudência consolidada
A partir da análise dos precedentes mais recentes do STJ, é possível extrair os seguintes parâmetros práticos:

🏁 4. Conclusão: o critério da razoabilidade probatória
A (in)dispensabilidade da formalização da autorização para ingresso em domicílio sem mandado judicial não depende de um formalismo cego, mas sim do conjunto probatório que cerca a diligência:
✅ Se há fundadas razões demonstradas objetivamente e relatos consistentes de autorização espontânea, a ausência de gravação não invalida a prova;
🚫 Mas se o contexto é duvidoso, os indícios de crime são frágeis e o consentimento é a única base da entrada, a prova de sua regularidade passa a ser indispensável, sob pena de violação à cláusula constitucional da inviolabilidade domiciliar.
Até a próxima! 👋