Jurisdição Voluntária: Aspectos Gerais

30/05/2025

🧭 Jurisdição Civil: Contenciosa vs Voluntária

Antes de aprofundarmos na jurisdição voluntária, é válido relembrar que o CPC/15 traz expressamente esta divisão da jurisdição: contenciosa vs voluntária. Vamo relembrar rapidamente o conceito de jurisdição contenciosa e suas características?

⚔️ Jurisdição Contenciosa

Ocorre quando há conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida.

📌 Características:

  • 📝 Ação

  • ⚖️ Lide

  • 🧾 Processo

  • 🗣️ Contraditório (ou sua possibilidade)

  • 📜 Produz coisa julgada

👩‍⚖️ Exemplo: ação de alimentos, reintegração de posse, indenização por danos morais.


📘 1. Jurisdição Voluntária: Conceito e Localização Sistemática

A jurisdição voluntária representa uma forma peculiar de intervenção do Poder Judiciário, sem litígio propriamente dito, e se materializa em atos de administração pública de interesses privados, onde o Estado exerce atividade de conformação jurídica, visando garantir segurança, regularidade e eficácia a determinadas relações jurídicas.

O Novo CPC, em seu art. 719 e seguintes, trata expressamente da jurisdição voluntária, conferindo-lhe natureza própria, com características singulares que desafiam as clássicas distinções entre jurisdição, administração e processo.


🧩 2. Natureza Jurídica: Correntes Doutrinárias


🏢 2.1. Teoria Administrativista ou Clássica

📚 Autores Principais: Arruda Alvim, Nelson Nery

  • Considera a jurisdição voluntária como uma atividade administrativa exercida pelo juiz, e não jurisdição em sentido técnico.

  • O magistrado não impõe sua decisão a partes em conflito, mas apenas homologa, autoriza ou valida atos jurídicos.

  • O juiz não substitui vontades, mas atua como um "oficial jurídico", exercendo função pública de controle da legalidade de interesses privados.


📌 Características:

  • Inexistência de contraditório pleno;

  • Ausência de lide;

  • Ausência de partes (há apenas interessados);

  • Não há processo, mas mero procedimento;

  • Inexistência de coisa julgada material.


⚖️ 2.2. Teoria Jurisdicionalista ou Revisionista

📚 Autores Principais: Dinamarco, Marinoni.

  • Sustenta que a jurisdição voluntária é verdadeira jurisdição, ainda que não contenciosa.

  • Há aplicação do Direito objetivo e o Estado exerce poder-dever jurisdicional ao controlar a conformidade jurídica de certos atos.

  • O juiz pode:

    • Iniciar de ofício (inquisitoriedade – arts. 738 e 744 do CPC);

    • Produzir provas contra vontade das partes;

    • Julgar contra a vontade de ambas;

    • Decidir com base na equidade (art. 723, parágrafo único, CPC).


📌 Portanto, trata-se de jurisdição em sentido material, pois há substituição da vontade das partes pelo pronunciamento estatal.


🌀 2.3. Teoria Autonomista

📚 Autor: Elio Fazzalari

  • Considera a jurisdição voluntária como uma função própria, nem administrativa nem jurisdicional, mas um modelo híbrido.

  • Propõe o reconhecimento de um "quarto poder funcional", que gere segurança e conformidade jurídica para relações sem conflito.

  • Defende a superação da dicotomia jurisdição/administrativo, com fundamento na complexidade das funções estatais contemporâneas.


🔬 3. Características Estruturantes da Jurisdição Voluntária


🟠 3.1. Obrigatoriedade

  • A jurisdição voluntária é obrigatória sempre que houver previsão legal que condicione o efeito jurídico à intervenção judicial (Ex: art. 610, §1º e 733, §§1º e 2º, CPC).

  • A expressão "voluntária" não implica em "facultativa".


🟡 3.2. Princípio Inquisitivo

  • O juiz pode agir de ofício, produz provas, e inclusive julgar contra a vontade das partes.


⚖️ 3.3. Juízo de Equidade

  • O juiz pode decidir sem observar rigorosamente a legalidade estrita, solucionando conforme o que for mais oportuno e conveniente, nos termos do art. 723, parágrafo único, CPC.


🟤 3.4. Fiscalização do Ministério Público

  • Conforme art. 721 do CPC, o MP deve atuar como fiscal da ordem jurídica em diversos procedimentos (Ex: interdição, tutela, curatela).


🧠 4. Elementos Polêmicos e Controvérsias


🚫 4.1. Inexistência de Caráter Substitutivo

  • O juiz não substitui a vontade das partes: apenas integra e valida o acordo.

  • A ausência de substitutividade é apontada pela teoria clássica como indicador da natureza administrativa.


📜 4.2. Inexistência de Aplicação de Direito ao Caso Concreto

  • A corrente administrativista afirma que o juiz não aplica o direito objetivo ao caso, apenas confirma o que já está legalmente permitido.

  • A teoria jurisdicionalista, por sua vez, afirma que há aplicação do Direito, sim, ainda que de forma orientadora e não impositiva.


⚔️ 4.3. Ausência de Lide

  • As vontades são convergentes. Todavia, a obrigatoriedade legal de obter intervenção judicial gera uma "resistência legal" que legitima a atuação do Judiciário.


👥 4.4. Não há Partes, mas Interessados

  • Segundo a doutrina clássica, há apenas "interessados", pois não há antagonismo entre sujeitos.


🔁 4.5. Não há Processo, mas Mero Procedimento

  • Há divergência doutrinária: muitos afirmam que existe processo, com contraditório e garantias; outros sustentam que há apenas um rito administrativo formalizado.


📄 4.6. Inexistência de Coisa Julgada Material

  • Para os administrativistas, a decisão pode ser modificada ou revogada, não sendo dotada de imutabilidade.

  • Contudo, jurisprudência atual e parte da doutrina defendem a existência de coisa julgada material, com base na segurança jurídica e estabilidade das relações jurídicas (Ex: art. 1.111 do CPC/1973 – revogado).


Até a próxima! 👋