O EMPRÉSTIMO NO DIREITO CIVIL: COMODATO E MÚTUO — UMA IMERSÃO DIDÁTICA

🏛️ 1. INTRODUÇÃO — A ESSÊNCIA DO EMPRÉSTIMO
📌 O empréstimo é o negócio jurídico pelo qual uma pessoa entrega gratuitamente uma coisa a outra, que se obriga a devolvê-la — ou outra de mesma espécie e quantidade, quando fungível.
Trata-se de contrato unilateral e gratuito, desdobrado em duas espécies:
🧺 a) Comodato — Empréstimo de uso
🔸 O objeto é infungível e inconsumível.
🔸 A coisa deve ser restituída tal como foi entregue.
🔸 É o famoso "empresta e devolve o mesmo bem".
💰 b) Mútuo — Empréstimo de consumo
🔸 O objeto é fungível e consumível.
🔸 A restituição ocorre por coisa equivalente, não pela mesma.
🔸 É o paradigma do empréstimo de dinheiro.
⚠️ Por serem contratos reais, tanto comodato quanto mútuo somente se aperfeiçoam com a entrega efetiva (traditio).
🏺 2. O COMODATO (arts. 579 a 585 CC)
✨ 2.1 Natureza e elementos essenciais
O comodato é um contrato unilateral, gratuito e benéfico, celebrado entre:
👤 Comodante — quem empresta.
👤 Comodatário — quem recebe.
Seu caráter é intuitu personae: fundamenta-se na fidúcia do comodante. Não exige forma escrita.
Embora normalmente recaia sobre bens infungíveis e não consumíveis, a doutrina reconhece a existência do:
🎀 Comodato ad pompam vel ostentationem
Quando bens fungíveis são emprestados para enfeite ou exibição, como:
🍇 cestas de frutas exóticas;
🥃 garrafas de uísque raro;
🎡 elementos ornamentais.
Nessas hipóteses, a convenção das partes converte o fungível em infungível, pois será devolvida a mesma coisa, não equivalente.
🕰️ 2.2 Prazo e restituição
O comodato pode ser:
🔸 a prazo determinado, ou
🔸 prazo indeterminado, presumido para o uso concedido.
⚠️ Regra de ouro:
👉 Antes do fim do prazo ou do uso concedido, o comodante não pode exigir a restituição, salvo necessidade imprevista e urgente, reconhecida judicialmente.
A violação gera perdas e danos.
💸 2.3 Mora do comodatário e o aluguel-pena (art. 582)
Findo o prazo, deve o comodatário restituir imediatamente.
Caso não devolva:
🔹 responde pelo bem;
🔹 deve pagar aluguel arbitrado pelo comodante, até a devolução.
Esse aluguel:
🔥 É pena privada, não locação (STJ, REsp 1.175.848).
🔥 Visa coagir à devolução, não transforma comodato em locação.
⚖️ Deve obedecer à boa-fé objetiva, vedado o abuso.
📘 Enunciado 180 da III Jornada de Direito Civil:
➡️ O juiz pode limitar o valor do aluguel-pena, aplicando-se por analogia o art. 575, parágrafo único CC/02.
🔧 2.4 Uso indevido e custódia da coisa
O comodatário deve conservar a coisa como se sua fosse.
Se utilizar em desacordo com a finalidade ou natureza:
➡️ responde integralmente por perdas e danos.
🔥 2.5 Caso fortuito e força maior — Responsabilidade objetiva do comodatário (art. 583)
Se houver risco simultâneo entre:
🔹 A coisa emprestada e
🔹 Coisa própria do comodatário,
e este optar por salvar seu próprio bem, ainda que o dano resulte de fortuito ou força maior,
➡️ responderá integralmente ao comodante.
📍 Exemplo clássico:
Cavalo Puro-sangue de Pablo x pangaré de Rodolfo → Rodolfo salva o pangaré.
Resultado: responsabilidade integral, mesmo sendo raios e incêndio.
🏗️ 2.6 Benfeitorias — debate doutrinário e jurisprudencial
Por ser possuidor de boa-fé:
🔸 necessárias → indenização + retenção
🔸 úteis → indenização + retenção
🔸 voluptuárias → direito de levantar, se não danificar o bem
Todavia:
⚠️ A jurisprudência é vacilante, com decisões estaduais negando indenização.
⛔ STJ ainda não decidiu a questão — informação essencial presente no material.
💰 3. O MÚTUO (arts. 586 a 592 CC)
3.1 Estrutura e natureza
O mútuo envolve:
👤 Mutuante — quem empresta,
👤 Mutuário — quem recebe.
Em regra:
🔹 é unilateral;
🔹 gratuito;
🔹 real;
🔹 comutativo;
🔹 temporário;
🔹 informal.
A propriedade da coisa fungível transfere-se ao mutuário, tornando-o responsável pelos riscos do bem desde a tradição.
🛡️ 3.2 Garantias no mútuo (art. 590)
Se o mutuário tiver alteração notória em sua situação econômica antes do vencimento:
➡️ o mutuante pode exigir garantia real ou fidejussória.
➡️ Se não oferecida → vencimento antecipado da dívida.
👶 3.3 Mútuo feito a menor — ineficácia e exceções (art. 589)
O mútuo concedido a menor sem autorização ❌ não pode ser cobrado:
🔹
nem do menor
🔹
nem dos fiadores.
Trata-se de obrigação natural: "Schuld ohne Haftung" — dívida existente sem responsabilidade.
✔️ Pode ser cobrada se ocorrer qualquer das exceções:
1️⃣ Ratificação posterior pelo representante.
2️⃣ Empréstimo para alimentos habituais, na ausência do responsável.
3️⃣ Menor com ganhos de trabalho (execução limitada às suas forças).
4️⃣ Empréstimo que reverteu em benefício do menor.
5️⃣ Empréstimo obtido maliciosamente pelo menor.
💸 3.4 Mútuo oneroso — juros, bancos e capitalização (art. 591)
O mútuo oneroso (feneratício) admite:
📌 cobrança de juros, que são frutos civis.
🔹 As instituições financeiras NÃO se submetem à Lei da Usura — podem cobrar taxas de mercado.
🔹 Capitalização de juros: permitida se pactuada expressamente (STJ – REsp 1.388.972).
🔹 Repetição de indébito: mutuário não pode exigir devolução com a mesma taxa cobrada pelo banco (REsp 1.552.434/2018).
🏦 3.5 Cancelamento da Súmula 603 e descontos em conta-corrente
A antiga Súmula 603 do STJ vedava retenção de salário para quitar mútuo comum. Foi cancelada em 2018.
🧠 O novo entendimento (REsp 1.555.722):
Há duas situações:
❌ 1. Apropriação ilícita
Banco retém valores unilateralmente, inclusive tarifas e multas → ilícito.
✔️ 2. Desconto voluntário e contratual
Se as partes pactuaram livremente:
➡️ Pode haver desconto em conta-corrente,
➡️ mesmo se for a conta onde o salário é depositado,
➡️ desde que o correntista não revogue a ordem.
⏳ 3.6 Prazos do mútuo sem estipulação (art. 592)
Quando o contrato é omisso:
🌾 Produtos agrícolas → até a próxima colheita.
💵 Dinheiro → 30 dias da celebração.
🪙 Demais fungíveis → prazo fixado pelo mutuante, sujeito a controle judicial se insuficiente.
📅 3.7 Prescrição
📜 Instrumento escrito e líquido → 5 anos
📜 Mútuo verbal → 10 anos
(Conforme STJ — REsp 1.510.619/2017)
Até a próxima! 👋
